Acabo de rever C'eravamo Tanto Amati (Nós que nos amávamos Tanto) de Ettore Scola. Foi, um pouco, incômodo. Não me refiro ao fato de ter de assistir as falas no original, em italiano. Ao final, acredito, isso preserva grandemente a alma do filme, a despeito do mau estado em que se encontra meu domínio do idioma. Meu desconforto deveu-se, isso sim, a "inspeção", a auditoria voluntária a que me submeti, ao assistir a excelente obra de Scola. Para quem não assistiu ou, como eu, assistiu há décadas atrás, a trama versa sobre 4 amigos que se reencontram anos mais tarde e, confrontam, re-examinam seus velhos ideais e, como o miúdo da vida corroeu, corrompeu, destruiu, alterou o sonho de cada um. Apesar de, isto posto, soar nostálgico, melancólico, o filme não é sempre assim. Ao contrario; é bem-humorado. Scola concretiza a sabedoria de que, ver com bom humor a própria tragédia, é grandeza de espírito. Sim, porque muito do que ali está, por certo não é uma ficção mas, sim, o testemunho de algo que o próprio Ettore foi contemporâneo.
A certa altura do filme, um dos personagens constata e declara, sem disfarçar a amargura e, sem desacreditar o fato patético de que "...nós que pretendíamos mudar o mundo, fomos, pelo mundo, mudados." Também é, tão desgraçadamente atual, ver um dos quatro amigos, uma jovem mulher neste caso, pernoitando em frente a escola pública, para poder conseguir vaga para o menino filho. A frase dita por seu marido, outro dos 4 amigos, é atualíssima: "Dizem-nos que ir a escola é uma obrigação! Mas, não nos dão esse direito!". Na mesma seqüência, e como somente esses mestres "malditos" do cinema italiano sabem fazer, outro dos amigos que, anos atrás, foi apaixonado pela amiga que agora madruga pela vaga escolar para o filho, serve-nos outra cena deliciosa; amargamente romântica. Enquanto o marido desta, outro dos 4 amigos, canta ao violão, acompanhado de um grupo de madrugadores por vaga escolar ao redor de uma fogueira, aquele declara ao antigo amor: "Pensei em você todos estes anos, Luciana". Esta: "Eu nunca mais pensei em você. Casei-me com Antonio; tivemos dois filhos... nós brigamos". Ele: "Eu pensei que um grande amor... fosse um grande amor". E, retira-se, levando consigo uma enorme e final lição de vida e de amor. Sim, porque há um e, há o outro. Há quem viva toda uma vida, sem perceber que teve um amor. E, assim fazendo, nunca, de fato, o teve.
Outra passagem divertida é quando, em uma discussão, a esposa diz ao marido que "...a morte sublima todos os pecados...", com o que este não concorda. Para dar veracidade a afirmação que acabou de fazer, esta lembra ao marido que, a frase consta do "Sidharta" o qual ele tanto recomendou a ela que lesse, enquanto que ele próprio nunca o fez... Um pouco de nosso Chico.
Scola aborda os vários e mais importantes aspectos da vida, cuidadosamente construídos para os personagens de seu filme. Impossível falar de todos aqui, o que fiz, parcamente, a respeito de uns poucos. Assistam o filme! Scola ensina a Vida...
No comments:
Post a Comment